Publicações Digitais

Será a agricultura biológica sustentável?

Autor: 

Carla Amado Gomes e Rute Saraiva (coord.)

Editora: 

ICJP

ISBN: 

978-989-8722-21-8

Ano da Publicação: 

2017
 
APRESENTAÇÃO

"A 4 de Novembro de 2016, realizou-se na Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, uma conferência com o título provocatório: Será a Agricultura Biológica Sustentável?

A iniciativa, que beneficiou do apoio do Colégio F3 da ULisboa, contou propositadamente com três painéis, distintos no seu objecto e na formação de base dos seus intervenientes, de forma a cobrir, de modo transdisciplinar, as três principais traves mestras identificadas para a justificação e promoção da Agricultura Biológica, a saber: o enquadramento legislativo, os recursos, e a sociedade — nesta incluindo a dimensão de mercado.

Num contexto de: crescimento demográfico a nível global; de pressão excessiva sobre o factor ‘terra’ num planeta finito; de uma sociedade de risco que enfrenta desafios estruturais, entre outros, no plano ambiental, energético, alimentar e até cultural, a (necessária) mudança de paradigma na produção e indústria agro-alimentares e na fileira florestal suscita anseios e discussões entre os diversos stakeholders, em especial atendendo ao nível de desenvolvimento dos Estados e do peso do primeiro sector na economia nacional.

Se de forma superficial todos os intervenientes parecem motivados para a promoção e defesa de uma agricultura sustentável, a verdade é que, na prática, não a sustentam, demonstrando entendimentos díspares quanto à sua conceptualização e execução. Assim, se para uns ser ‘sustentável’ significa garantir o sustento, maxime ser lucrativo, em particular numa perspectiva continuada; para outros, reconduz-se a um regresso ao passado e a um modo de produção “tradicional” ou ligado ao saber dos antigos ou dos indígenas, num misto de saudosismo e de crença num homem primitivo bom, e de desconfiança relativamente a um mundo demasiado célere e tecnológico.

Mais, se para uns ser ‘sustentável’ representa a capacidade de produzir a quantidade necessária de géneros agrícolas face ao solicitado pelo mercado — sobretudo quando este aumenta constantemente de tamanho, seja por via da globalização, seja por via demográfica; para outros, revela a preocupação com as características qualitativas do processo produtivo e dos bens finais, mormente com uma menor pegada ecológica, sendo até reconduzida a uma agricultura local, de preferência comunitária e urbana.

Enfim, se para uns ser ‘sustentável’ descobre a problemática da regularidade do financiamento (essencialmente público) da agricultura por via de ajudas várias e subsídios ameaçados pela crise financeira recente (tanto na perspectiva da instabilidade dos mercados financeiros como do agravamento das dívidas soberanas); para outros, abarca a durabilidade da “moda verde”, alicerçada na importância da diferenciação de produtos para vingar no mercado, e nos acrescidos cuidados com a saúde e na consciencialização ambiental, social e cultural dos consumidores, que pretendem assegurar algum controlo sobre o processo produtivo.

Em suma, e considerando até a possibilidade de combinação de elementos dos vários entendimentos agora descritos, não se adivinha sequer uma compreensão unívoca de agricultura sustentável, o que bem explica a forma interrogativa do título da conferência. Ou seja, mesmo uma agricultura biológica, poderá não ser sustentável.

Aliás, mesmo se, em termos legais, na sequência do Direito europeu, se procura recortar o modo de produção biológico e consequentemente regulá-lo, tal como explorado na intervenção de Carla Amado Gomes, na verdade, mesmo no plano jurídico nacional, principalmente ao nível municipal, a confusão instala-se na sua concreta delimitação nos regulamentos sobre hortas urbanas, como salientado por Rute Saraiva. Por outras palavras, até uma agricultura biológica poderá não ser “biológica”, inclusive considerando riscos de contaminação ou de fragilidade nos procedimentos de certificação quando existentes e exigidos.
Pesem estas dificuldades semânticas e conceptuais, a agricultura biológica poderá encontrar no Estado, em geral, e na contratação pública, em particular, um incentivo que auxilie na sua sustentabilidade — tal como é defendido por Cláudia Monge.

Por fim, como discute Susana Fonseca, o modelo actual de produção agrícola obriga a repensar o paradigma alimentar e à implementação de um conjunto de medidas exequíveis para incentivar a aposta numa verdadeira agricultura sustentável. Entre elas, apesar da polémica associada, poderá estar o recurso às agrobiotecnologias, como explicado por Jorge Marques da Silva, e na utilização preferencial dos solos urbanos para estufas de produção agrícola intensiva, como proposto por Fernanda Paula Oliveira e Dulce Lopes.

A conferência foi muito participada e o debate muito animado. As coordenadoras agradecem aqui a todos os intervenientes, oradores e público, e esperam que a publicação de algumas das comunicações permita a continuação da discussão das questões associadas à Agricultura Biológica."

 

ÍNDICE

O Direito da agricultura biológica:
notas sobre o regime jurídico português

Carla Amado Gomes

Contratos públicos ecológicos
Cláudia Monge

A agricultura urbana na busca da sustentabilidade
Rute Saraiva

Água e azeite? Sobre as relações entre agricultura
biológica e agrobiotecnologia

Jorge Marques da Silva

Agricultura Biológica e Sustentabilidade
Susana Fonseca

Estufas agrícolas em solo urbano:
solução contraditória ou adequada?

Fernanda Paula Oliveira e Dulce Lopes